OBREIROS: OVELHAS OU PORCOS
A Palavra de Deus ordena: “Obedecei a vossos pastores, e sujeitai-vos a eles; porque velam por vossas almas” (Hb 13.17), aumenta a cada dia o número de cristãos rebeldes, que não se sujeitam aos líderes eclesiásticos chamados verdadeiramente por Deus e pensam que estão certos. Não respeitam pastores, verberam contra a liderança e afirmam que só devem obediência a Deus. “Igreja não é quartel general”, afirmam. E, generalizando, chamam qualquer liderança firme e segura de coronelista. Na Bíblia, a Palavra de Deus, vemos que o próprio Deus prioriza e hierarquiza. Ele — que podia ter formado todas as coisas com uma única palavra — fez questão de formar tudo a seu tempo, dia após dia (Gn 1). O Senhor também pôs em ordem as tribos de Israel (Nm 2). Nosso Deus é um Deus de ordem (1 Co 14.40).
De acordo com 1 Coríntios 12.28, vemos que Deus hierarquiza dons e ministérios. A hierarquia, nesse caso, existe, não para que o portador de certo dom e ministério se considere superior aos outros, e sim para que haja ordem. Deus pôs na igreja “primeiramente apóstolos” (1 Co 12.28; Ef 4.11). Os apóstolos são homens de Deus, enviados por Ele, com grande autoridade, e não autoritarismo, que formam a liderança maior da igreja — independentemente dos títulos empregados pelas denominações (pastores-presidentes, bispos, reverendos, pastores, presbíteros, etc.). Mas não se deve confundir títulos com ministérios e dons. Estes vêm do Espírito Santo, enquanto os títulos são conferidos pelos homens. Na Assembleia de Deus fiel ao seu perfil teológico-eclesiástico-consuetudinário original, por exemplo, não existe o título de apóstolo. Mas isso não significa que não exista o ministério apostólico. Este, segundo a Bíblia, perdurará “até que todos cheguemos à unidade da fé e ao conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da estatura completa de Cristo” (Ef 4.13).
O texto de 1 Coríntios 12.28 afirma, também, que Deus pôs na igreja “em segundo lugar, profetas”, mencionados em Efésios 4.11 na mesma posição, depois dos apóstolos. Os profetas que receberam, de fato, o ministério profético, não devem ser confundidos com os crentes que falam em profecia nos cultos, também chamados de profetas em 1 Coríntios 14.29. O ministério profético neotestamentário é formado por pregadores (pregadores, mesmo!) da Palavra de Deus, portadores de mensagens proféticas. Em seguida, a Palavra do Senhor, ainda em 1 Coríntios 12.28, assevera: “em terceiro, doutores”. Veja como essa hierarquização ocorria na igreja de Antioquia da Síria: “havia alguns profetas e doutores, a saber: Barnabé, e Simeão, chamado Níger, e Lúcio, cireneu, e Manaém, que fora criado com Herodes, o tetrarca, e Saulo” (At 13.1). Nesse caso, os doutores, que atuam juntamente com os profetas, são ensinadores da Palavra de Deus. Há casos, como o de Paulo, em que três ou dois dos ministérios mencionados (apóstolo, profeta e doutor) estão presentes (1 Tm 2.7). Os ministérios de pastor e evangelista certamente fazem parte dos três escalões mencionados em 1 Coríntios 12.28, posto que são títulos relacionados com a liderança maior da igreja.
Em 1 Coríntios 12.28, também está escrito: “depois, milagres, depois, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas”. Milagres só vêm depois de apóstolos, profetas e doutores? Isso mesmo. Na hierarquização feita por Deus, o ministério da Palavra é mais prioritário que os milagres, haja vista serem estes o efeito da pregação do Evangelho (Mc 16.17). Observe que João Batista foi considerado por Jesus o maior profeta dentre os nascidos de mulher, mesmo sem ter realizado sinal algum (Jo 10.41). Se não houver hierarquia nas igrejas, para que servirão os cargos e funções? Qualquer pessoa, dizendo-se usada por Deus, poderá mandar no pastor. Aliás, isso estava acontecendo na igreja de Tiatira, e o próprio Senhor Jesus repreendeu aquele obreiro frouxo que não estava exercendo a liderança que recebera do Senhor (Ap 2.20).
A civilização humana é regida por princípios que a tornam viável. Um deles é o que diz respeito à autoridade. Cada pessoa tem seu próprio raciocínio, sua própria vontade. Cada um de nós tem sua própria visão da vida e das circunstâncias e vai, assim, tomando suas próprias decisões (Jz.21.25). Entretanto, quando vivemos em grupo, torna-se necessária uma direção comum. Se cada integrante agir de modo independente, o grupo deixará de existir. Considerando que os agrupamentos humanos existem para que objetivos comuns sejam alcançados, então, em princípio, não convém dispersá-los. Portanto, para que os grupos existam e sejam eficientes, torna-se necessária a figura do líder, ou líderes, com hierarquia definida. O corpo precisa da cabeça para ter direção. Um animal com mais de uma cabeça seria um monstro, como a besta do Apocalipse (13.1). Então, é necessário que haja uma liderança claramente identificada.
Na época dos juízes, o povo de Israel vivia caindo sob o jugo dos inimigos. Rejeitavam a autoridade divina e não havia autoridade humana estabelecida. Não havia rei em Israel (Jz.21.25). Cada juiz se levantava para exercer um ministério de pequena duração. Por outro lado, quando os reis foram estabelecidos, a nação judaica conheceu sua época de maior prosperidade em toda a história, principalmente no reinado de Salomão. A partir daí os reis começaram a se corromper, distanciando-se do padrão deixado por Davi. Então todo o povo também foi se perdendo até que foram para o cativeiro.
A melhor parte da história de Israel corresponde ao período em que havia uma liderança estabelecida por Deus e que dirigia o povo de acordo com a vontade divina. Todo grupo precisa de uma liderança. Se ela não existir, cada um fará o que bem lhe parecer, até que o grupo se desintegre. Por outro lado, se a liderança existe mas não é obedecida, é como se não existisse. Os resultados serão, da mesma forma, fracasso e desintegração do grupo.
Havendo liderança, estarão presentes os conceitos de autoridade, submissão e obediência. Embora já tenhamos consciência sobre o assunto, precisamos compreendê-lo com mais profundidade. Quando compreendemos, agimos com base em propósitos conscientes e de modo mais eficiente, deixando de viver apenas reagindo de maneira instintiva.
Termos como “submissão” e “obediência” podem produzir alguma resistência interior. De onde vem esse sombrio sentido que muitas vezes envolve a noção de submissão? Existem marcas do passado, coletivo e até individual, que causam esse pensamento. Quando olhamos para trás, nos lembramos do autoritarismo representado pela escravidão, experiência comum a tantos povos em tantas épocas, e também nos assustam as ditaduras governamentais. A experiência que se teve, ou que não se teve com os pais, é um dos fatores mais decisivos na noção que cada pessoa tem sobre a relação de autoridade e submissão. Por isso, é tão importante que pais e filhos sejam instruídos para que tenham um relacionamento sadio. Um filho que se rebela contra os pais, terá dificuldades para se submeter a qualquer outra autoridade durante toda a sua vida. Entretanto, os próprios pais podem ter sido responsáveis por esse dano, não tendo exercido corretamente sua autoridade.
Liderança – uma questão de organização – Muitas vezes a relação autoridade-submissão é confundida com um confronto entre poder e impotência, força e fraqueza. Embora esses conceitos estejam frequentemente relacionados, não devem necessariamente estar. A liderança existe para que o grupo tenha direção, para que os recursos humanos e materiais possam ser corretamente direcionados visando o objetivo comum. Não significa que o líder seja maior ou mais importante que os seus liderados. Portanto, o líder não deverá se sentir superior nem o liderado inferior. Suas posições são temporárias e necessárias para o funcionamento da organização. Apenas isso. Todos são importantes. O líder precisa do grupo e vice-versa. Muitas vezes, a própria capacidade do líder se transforma em vaidade. Então, está pronto o cenário da sua ruína, e normalmente o grupo é arruinado com ele.
O que é autoridade? É o legítimo poder de comando ou de ação. O líder é aquela pessoa que reúne as condições necessárias para conduzir o grupo ao objetivo comum. Do passado ele precisa trazer conhecimento, experiência e, como resultado, habilidade. Em relação ao presente, precisa ter ampla e clara percepção. Quanto ao futuro, o líder precisa ter visão. Estamos falando de conceitos ideais. Na prática, destaca-se a pessoa que consegue reunir a melhor combinação possível desses elementos.
A percepção faz com que o líder acolha idéias dos seus subordinados. Afinal, o liderado está ali para contribuir. O líder será capaz de CAPTAR o que há de melhor em todos os membros do grupo e DEFINIR o rumo da equipe. Algumas vezes ele RECUSARÁ sugestões e DECIDIRÁ o que será feito, mas, se o líder é SÁBIO, CAPAZ E HABILIDOSO, sua decisão obterá reconhecimento, respeito e apoio, sem agressões nem traumas, uma vez que o grupo reconhece que o OBJETIVO está sendo buscado.
O conhecimento que o líder possui é fundamental para o desempenho do seu papel. Geralmente, o pastor conduz o rebanho por um caminho conhecido. Ele mesmo já passou por ali antes. Em outros casos, o caminho não é conhecido mas o pastor já conhece tantos caminhos, que pela simples observação já sabe dizer se aquele lugar é seguro ou não. O líder precisa dar exemplo (Hb.13.7), tomar a iniciativa, sendo o primeiro a praticar o que exige. Precisa cuidar do grupo, buscando o bem e o objetivo coletivo. Assim, será obedecido com alegria
Tipos de autoridade e liderança
Natural – ocorre a partir do notório conhecimento ou habilidade em determinada área ou assunto.
Eleita – é a liderança escolhida pelos liderados em razão do reconhecimento de suas características naturais.
Delegada – é a autoridade transferida hierarquicamente. Seu exercício se estabelece por indicação superior.
Imposta – é a autoridade exercida por meio da força. A imposição não é o melhor caminho. Algumas vezes isso significará a existência de uma falsa autoridade, ou ocorrerá como resposta à resistência à verdadeira autoridade. O uso da força será legítimo em alguns contextos, como é o caso da força policial e judicial (Rm.13.4). Na família, por exemplo, os pais podem impor aos filhos determinadas ações necessárias ou disciplina (Pv.13.24; 22.15; 23.13-14; 29.15). Contudo, a força precisa estar limitada aos termos da lei e do benefício maior que se deseja (Pv.19.18). Em alguns contextos, não existe lugar para o uso da força (Zc.4.6). Na administração da igreja, por exemplo, nada se fará por meio da força e da violência, mas voluntariamente, por amor, e pela ação do Espírito Santo.
Os conceitos sobre tipos de autoridade podem aparecer em conjunto. Quando alguém se destaca como líder natural e é eleito pelo grupo, isso se torna bastante agradável e produtivo. Se a autoridade for delegada a uma pessoa naturalmente capaz, então o resultado também poderá ser positivo. Muitas vezes a autoridade é transmitida por hereditariedade. Isso ocorre principalmente nos regimes monárquicos. Se o herdeiro do trono é uma pessoa capaz, então, sua autoridade é natural e poderá ser muito bem sucedida. Contudo, algumas vezes a autoridade é herdada sem a respectiva capacidade. O resultado é a imposição, a ditadura, a insatisfação geral e o fracasso. Nos livros dos Reis de Israel e Judá encontramos vários relatos que podem ilustrar tais situações.
Quando pensamos no contexto eclesiástico da questão, devemos nos lembrar de que, além das capacidades naturais, Deus nos dá capacidades espirituais, dons e ministérios que vão muito além do que poderíamos fazer por nós mesmos (II Cor.3.5). O líder espiritual deve ter o conhecimento e os dons necessários para o exercício do seu ministério. Como alguém pode ser um pastor sem conhecer as Sagradas Escrituras?
A origem da autoridade legítima está em Deus (Rm.13.1). Tal afirmação tem fundamento bíblico, mas seu entendimento na prática nem sempre é fácil. Quando vemos um líder bom, logo reconhecemos que sua autoridade vem de Deus. Quando vemos um líder mau, temos a tendência de questionar sua autenticidade. Afinal, existem líderes que governam com base em falsas doutrinas e até em nome do Diabo, como é o caso dos líderes satanistas. Nesses casos, não existe autoridade legítima. Contudo, Deus permite que tais líderes subsistam, por motivos que fogem ao nosso conhecimento. Alguns deles são, como o próprio Satanás, instrumentos da ira e do juízo divino.
Mesmo que uma autoridade seja legítima, existem diferentes modos de exercê-la. O líder pode ser duro, áspero, cruel, ou pode, e deve ser, amável e respeitoso (Pv.29.21). Pelo menos, no contexto eclesiástico, é o que se espera do líder: um coração de bom pastor e bom pai. O autoritarismo ocorre quando não há respeito aos subordinados nem aos limites da autoridade. O líder não deve usar sua autoridade como pretexto para ser cruel, mal ou grosseiro. O líder não está autorizado a humilhar gratuitamente seus subordinados, embora a legítima disciplina possa ser, inevitavelmente, humilhante. Contudo, até nesse momento, o líder precisa ser equilibrado para não submeter o subordinado infrator a um vexame desnecessário. A dignidade humana deve sempre ser levada em consideração. Talvez seja melhor morrer dignamente do que viver humilhado. A bíblia diz: “humilhai-vos perante o Senhor e ele vos exaltará” (Tg.4.10). Cada um deve humilhar a si mesmo na medida necessária, se for necessário. A bíblia nunca disse: humilhai-vos uns aos outros.
Pode haver situações em que o líder precisará agir com rigor, mas estes serão casos excepcionais. O rigor deve ser a exceção e não a regra. Talvez nas instituições militares a austeridade seja sempre necessária, mas não vejo dessa forma o convívio na igreja.
Limites da autoridade – O único que possui autoridade suprema é Deus. No que diz respeito ao contexto humano, a autoridade está pulverizada em áreas abstratas e concretas: são as “jurisdições”. A tentativa de concentrar autoridade absoluta nas mãos de um homem, só pode produzir equívocos, arbitrariedades e males abundantes. Para ter todo poder e toda autoridade, o líder precisaria ter todo o conhecimento e estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Como sabemos, o único onisciente e onipresente é Deus. Por isso, só ele é onipotente. Os três conceitos são tão intrínsecos entre si que não podemos lhes atribuir uma ordem rigorosa.
A desconsideração dos limites da autoridade traz como resultado o autoritarismo. A verdadeira autoridade deverá:
– Estar sujeita a uma autoridade superior. Isso só não acontece nos governos autocráticos. Em nosso sistema, a constituição está acima dos poderes da república. O exemplo mencionado por Paulo é bastante oportuno: O marido é o cabeça da mulher, mas ele mesmo tem um cabeça que é Cristo, e Cristo tem um cabeça, que é Deus (I Cor.11.3). No caso dos líderes da igreja, deve haver uma hierarquia e sobre todos eles está Cristo, pois ele é o cabeça da igreja. Se um líder rejeita as autoridades superiores a ele, então sua própria autoridade será questionada, pois quebrou a hierarquia (Col. 2.18-19). Assim, se um líder estabelece decisões contrárias ao que conhecemos da vontade de Deus, então tais ordens deverão ser desobedecidas. Afirmamos isso com fundamento bíblico, porque “mais importa obedecer a Deus do que aos homens” (At.4.19). As parteiras egípcias desobedeceram ao rei Faraó, quando este ordenou que os meninos hebreus fossem assassinados (Êx.1.17). Raabe desobedeceu ao rei de Jericó quando este lhe ordenou que entregasse os espias israelitas (Js.2.3-4). Os magos desobedeceram ao rei Herodes, quando este lhes pediu que fosse informado sobre a localização do menino Jesus (Mt.2.8,12). Os apóstolos desobedeceram às autoridades públicas, quando estas lhes proibiram de pregar o evangelho (At.4.19). Contudo, este argumento não pode ser usado como desculpa para justificar a rebeldia, a preguiça e outros motivos escusos que venham produzir a desobediência.
– A verdadeira autoridade deve limitar suas exigências. Vemos em Atos 15, que os apóstolos decidiram exigir dos gentios apenas o que era necessário, imprescindível. Portanto, o que era necessário para os israelitas no deserto, e por isso foi exigido por Deus, já não é necessário para nós hoje. Sabemos que em vários setores, o nível de exigências pode variar, pois a necessidade também varia. O líder precisa estar atento aos limites de seus liderados, procurando manter suas decisões e ordens dentro das possibilidades de execução. Os prazos de cumprimento e a organização geral das tarefas serão bastante favoráveis para que as exigências sejam cumpridas de modo suave e agradável. Numa guerra isso não é possível, mas nem sempre estamos em guerra.
– A verdadeira autoridade decide com base nos objetivos do grupo – O líder não deve manipular os liderados na direção do seu belprazer (Col.2.18-19), buscando seus interesses egoístas. Por exemplo, a autoridade de trânsito comanda o fluxo de veículos de acordo com a legislação e a necessidade e não para atender suas preferências pessoais.
O líder cristão conduz a igreja ou grupo de irmãos de acordo com o padrão bíblico e não com o objetivo de construir seu próprio patrimônio ou exaltar seu próprio nome. Este e outros parâmetros podem ajudar a identificar os lobos vestidos de ovelhas, cujo objetivo não é conduzir o rebanho mas extrair dele o maior benefício pessoal possível. Isso não significa que o verdadeiro líder não possa ser beneficiado. Certamente o será, mas junto com o grupo e não em detrimento deste.
Liderança segundo Jesus Cristo – Podemos mencionar muitos exemplos históricos, inclusive bíblicos, sobre relações de autoridade e submissão. São episódios diversos, bons ou maus, mas acima de tudo isso está o conceito revolucionário que Jesus trouxe sobre essa questão: o líder cristão é um servo. Sob o ponto de vista humano, natural, tal afirmação é completamente absurda. Portanto, temos diante de nós dois padrões de liderança: o modelo mundano e o modelo de Cristo. Vejamos as palavras do Mestre sobre o assunto:
“Jesus, pois, chamou os seus discípulos para junto de si e lhes disse: Sabeis que os governadores dos gentios os dominam, e os seus grandes exercem autoridades sobre eles. Não será assim entre vós; antes, qualquer que entre vós quiser tornar-se grande, será esse o que vos sirva; e qualquer que entre vós quiser ser o primeiro, será vosso servo; assim como o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em resgate de muitos.” (Mt.20.25-28).
Os discípulos, em seu tempo de imaturidade, viviam disputando entre si para ver qual deles seria o maior. Esperavam que Jesus libertasse Israel do domínio romano e que, então, cada um deles pudesse ter uma posição de autoridade no Reino de Deus. Qual não foi sua surpresa quando Jesus disse que eles deveriam ser servos! Da mesma forma, todos os líderes cristãos devem ser servos. Os líderes existem para servir à igreja. Ministério, de acordo com o Aurélio é “trabalho ou função de serviço na igreja.” Ministrar é servir. Imbuído desse pensamento, o líder será humilde. Não terá complexo de superioridade nem maltratará seus liderados.
Jesus, o Príncipe da paz, o Rei esperado por Israel, ajoelhou-se e lavou os pés dos discípulos, inclusive os de Judas. Esta é a atitude que o líder cristão deve ter. Não buscando ser servido, mas servir, como o próprio Jesus fez.
A importância da obediência – nós, que estamos debaixo de autoridade, devemos obedecer. Sabendo que nossos líderes estão se empenhando por exercerem uma liderança sábia e justa, nada nos resta senão a fiel obediência. E por quê o faremos? Todo grupo tem um objetivo que justifica sua existência. Se obedecemos, estamos contribuindo para que o objetivo seja alcançado. Se desobedecemos estamos traindo a nós mesmos e prejudicando todo o grupo.
O grande problema da história de Israel foi a desobediência. Aliás, o grande problema da história humana é esse. Adão e eva tinham um único mandamento para cumprir e conseguiram desobedecê-lo. E assim continua até hoje. O povo de Israel foi desobediente ao Senhor. As consequências foram maldições diversas, inclusive o cativeiro, a perda terra de Canaã e a dispersão pelo mundo afora.
As palavras “lei” e “mandamento” parecem pesadas. Contudo, todos os mandamentos de Deus foram estabelecidos para o nosso próprio bem e para que o objetivo da nossa existência seja atingido em plenitude. Portanto, devem ser obedecidos. (Não estamos advogando a favor da lei mosaica, mas da vontade de Deus, de modo geral). Muitas vezes queremos entender as ordens de Deus. É melhor obedecer do que ficar tentando compreender.
Se o aluno desobedecer ao professor, estará prejudicando a si mesmo.
E se o paciente desobedecer ao médico? Pode ser fatal.
O soldado precisa obedecer ao capitão para que a tropa possa alcançar a vitória.
Cada músico da orquestra precisa obedecer ao comando do maestro para que se consiga harmonia e beleza. Se um deles resolver tocar sua própria música ou no seu próprio tom, poderá ter uma sensação de liberdade e independência, mas todo o grupo ficará prejudicado.
O maior exemplo – é o próprio Senhor Jesus. Em seu ministério terreno, Cristo demonstrou total obediência ao Pai. Portanto, além de ser o melhor exemplo de líder, ele é o melhor exemplo de filho e de servo (Hb.5.8; Fp.2).
Relações diversas – Existem vários tipos de relações humanas e em quase todas elas surge a questão da autoridade e submissão. Algumas vezes essas situações são involuntárias. Por exemplo, nascemos em uma família e em um país que não escolhemos. Com isso, podemos estar sujeitos a uma autoridade involuntariamente. Mesmo assim devemos ser obedientes dentro dos limites da consciência, da lei, e da vontade de Deus. Existem porém outros tipos de relação nas quais entramos por nossa própria vontade. Usando a linguagem bíblica, são jugos. Podem ser jugos leves (Mt.11.29-30) ou pesados (II Cor.6.14). Podemos incluir aqui a entrada em um matrimônio, em um grupo de louvor ou em uma comunidade qualquer. O que existe de comum em relações tão diferentes? Entramos por nossa própria vontade. Depois de feito o compromisso, temos a obrigação de cumprir com os deveres que nos forem designados. Existe opção para entrar ou não, mas não existe opção para desobedecer, observados os limites já expostos.
Se entramos voluntariamente em um grupo, não podemos agora agir contra ele. Não podemos desobedecer às determinações do líder. Certamente, o bom líder não é um ditador. O homem de Deus sempre estará pronto para ouvir (Tiago 1.19). Contudo, a decisão é do líder. Ele tem a prerrogativa de permitir uma decisão democrática. Existem assuntos que podem ser levados à votação, como vemos em exemplos bíblicos, mas tudo deve ser feito mediante a oração para que a decisão do líder ou do grupo seja a manifestação da vontade de Deus (At.1.23-26; 6.3-6). O líder estabelece critérios para a decisão do grupo, pode apresentar alternativas previamente selecionadas, e, por fim, vai aprovar ou não a escolha feita. Tudo isso é opcional. O líder pode também decidir sozinho. Se isso será bom ou mau, cada situação vai dizer. Os resultados de uma decisão solitária podem produzir prestígio ou até mesmo causar a queda do líder. Podemos até ajudar a decidir, mas, uma vez que a decisão foi tomada, não podemos desobedecê-la. Aqueles que fazem as leis também estão sujeitos a elas, e devem ser os primeiros a cumpri-las.
Algumas situações de jugo permitem sua dissolução. Não vamos tratar da questão familiar, mas nos concentremos nos demais grupos dos quais fazemos parte. Entramos neles voluntariamente. Da mesma forma podemos sair. O que não podemos fazer é desobedecer à liderança estando dentro do grupo. Portanto, temos opção: obedecemos ou saímos. A saída deve se dar, sempre que possível, de forma cordial e pacífica, e nunca sem oração para que a vontade de Deus seja feita.
Atitudes em relação à autoridade
Submissão é diferente de obediência. Submissão é o compromisso, a postura, atitude interior. Obediência é o cumprimento de uma ordem específica. Precisamos portanto, ser submissos e obedientes. Uma coisa não é suficiente sem a outra. Aquele que diz ser submisso, mas nunca cumpre uma ordem, deverá rever sua posição. Mas existem também aqueles casos de pessoas que cumprem ordens, mas estão se remoendo por dentro. São obedientes, mas não são submissas. Isso é mais comum em situações hierárquicas, onde se utiliza o termo “subordinado”. Querendo ou não, o soldado vai obedecer ao comando. Na igreja, porém, o que se deseja é que sejamos obedientes e também submissos. A submissão está no coração, nas intenções. Quem é submisso, obedece até na ausência do líder (Fp2.12).
O problema da murmuração
A obediência precisa ser aprendida. Precisamos crescer na obediência. O primeiro estágio é simplesmente fazer o que foi ordenado, mas Jesus disse que, se fizermos apenas isso, somos servos inúteis (Lc.17.10). Somos obedientes mas inúteis. Precisamos ir além. Como? Podemos tomar iniciativas próprias, podemos fazer mais do que aquilo que foi exigido, mas vejamos um outro detalhe sutil:
Muitas vezes obedecemos reclamando. Precisamos vencer esse mal. Um dos maiores problemas de Israel no deserto foi a murmuração. Viviam reclamando de tudo, reclamando do líder, reclamando de Deus. Observe que “murmuração” significa “falar baixo.” A murmuração é aquele tipo de reclamação às ocultas, aquela queixa que não produz nada além de disseminar um descontentamento geral.
Qual é a causa da murmuração? A insatisfação. Esta não pode ser simplesmente proibida ou ignorada. É como a ira, um sentimento espontâneo que podemos controlar mas não anular. Ela existe e persiste. O que fazer então? Precisamos examinar a raiz da nossa insatifação. Ele provém de um desejo. Tal desejo é legítimo? É egoísta ou de interesse do grupo?
Nossa insatisfação pode nascer do egoísmo. Então, nada nos resta senão obedecer e calar. Nada de murmurações. A insatisfação pode nascer também de um desejo bom, legítimo e importante. Então, devemos transformar nossa insatisfação numa contribuição para o grupo. Devemos levar ao conhecimento do líder a nossa opinião afim de que todos possam ser beneficiados. Vamos direcionar nossa energia para que o grupo possa melhorar seus planos e seu trabalho. Um dos motivos da insatisfação pode até ser um erro do líder (Ec.10.5).
A murmuração é pecado e pode trazer muitas conseqüências ruins. Se o pecado aconteceu, podemos reconhecer e pedir perdão, ou guardá-lo e sofrer as conseqüências. Mesmo sendo confessado e perdoado o pecado pode trazer conseqüências. Por isso ele é tão maligno (Pv.18.19).
Algumas vezes ficamos insatisfeitos por motivos particulares, mas precisamos lembrar que tudo é feito visando o objetivo do grupo. Podemos conversar com o líder com todo respeito, expondo nosso parecer, mas a decisão é do líder. Contudo, lembre-se de que o grupo não gira em torno de 1 indivíduo. Nem todas as nossas preferências serão atendidas em todo tempo. Porém, o nosso pedido pode ser de interesse geral e até favorável ao alcance do objetivo comum.
Quando um interesse é levado ao conhecimento do líder, ele pode ouvir e aplicar, ou não aplicar por não ser algo bom, ou não aplicar por não existirem recursos. Os liderados precisam também compreender as limitações do líder e do próprio grupo. Os israelitas no deserto estavam exigindo de Moisés muito mais do que aquilo que ele poderia oferecer. Ao invés de esperarem a chegada a Canaã, já queriam desfrutar de tudo no meio do caminho.
Deus é líder perfeito e infalível, mas ainda assim ele nos ouve e às vezes muda situações (Abraão diante de Sodoma, Moisés ao pé do monte Sinai, Jesus no Getsêmani). Quanto mais nas relações humanas deve haver esse diálogo. Nossa posição em relação a Deus nunca vai mudar. Sempre seremos seus filhos e seus servos, submissos a ele. Nas relações humanas, entretanto, nossas posições são alternáveis, exceto em algumas sociedades organizadas em castas. Quem é líder hoje poderá ser liderado amanhã e vice-versa. Por isso, Paulo disse que devemos nos sujeitar uns aos outros.
Apóstolo. Capelão/Juiz. Mestre e Doutor em Ciências da Religião Dr. Edson Cavalcante
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