ESTUDANDO O DOMÍNIO PRÓPRIO...
“Digo, porém: Andai em
Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne”. Gálatas 5:16
“Mas o fruto do
Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão,
temperança. Contra estas coisas não há lei. E os que são de Cristo crucificaram
a carne com as suas paixões e concupiscências. Se vivemos em Espírito, andemos
também em Espírito”. Gálatas 5:22-25
1 - Introdução
Não podemos esquecer,
que a vida cristã é aquela vivida no Espírito Santo. Na verdade, a vida cristã
só é possível no Espírito. Fora dele, nossa vida é como a de qualquer pessoa.
Entre as virtudes cristãs,
destacadas pelo apóstolo Paulo, está a do domínio próprio. Quando relaciona as
qualidades de um cristão, Paulo inclui o domínio próprio, junto com
hospitalidade, benignidade, sobriedade, justiça e piedade. O apóstolo Pedro
segue na mesma trilha, colocando como uma das virtudes a ser buscada pelo
cristão, ao lado do conhecimento, da perseverança e da piedade.
Esta é uma palavra
bastante problemática para nossa geração, acostumada à ideia de que a
felicidade decorre do desprezo à ideia de disciplina e autocontrole. Colocando
esta escolha em outros termos, podemos dizer que, para boa parte das pessoas,
se a escolha for entre felicidade e autocontrole, talvez ouçamos alguém se
dizer cansado de autocontrole e que agora pretende viver a vida com toda a sua
adrenalina. Prevalece a ideia que autocontrole e alegria são incompatíveis
No entanto, a Bíblia
nos adverte a não permitir que o pecado tenha domínio sobre nós (Romanos 6.14),
já que não estamos mais debaixo da lei, que nos leva a produzir, mas sob a graça,
que nos deve levar a frutificar, além do domínio próprio, em alegria, amor,
benignidade, bondade, fidelidade, longanimidade, mansidão e paz.
“Porque o pecado não
terá domínio sobre vós, pois não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça”.
Romanos 6:14
2 - O Sentido do Domínio Próprio
O apóstolo dava muita
importância ao termo (egkrateia), uma vez que
usa-o várias vezes. Em 1 Coríntios 9.25, trata-se da virtude de um
atleta em disciplinar seu corpo em busca da vitória.
“E todo aquele que luta
de tudo se abstém; eles o fazem para alcançar uma coroa corruptível; nós,
porém, uma incorruptível”. I Coríntios 9:25
É curioso que, quando
comparece perante o procurador romano Antonio Felix, que governou a Judéia de
52 a 60, o acusado apóstolo se defende falando de justiça, de juízo final e de
domínio próprio, para irritação do representante de Nero. (Atos 24:25)
“E alguns dias depois,
vindo Félix com sua mulher Drusila, que era judia, mandou chamar a Paulo, e
ouviu-o acerca da fé em Cristo. E, tratando ele da justiça, e da temperança, e
do juízo vindouro, Félix, espavorido, respondeu: Por agora vai-te, e em tendo
oportunidade te chamarei”. Atos 24:24-25
Podemos entender melhor
o que é domínio próprio pensando no seu oposto. Quem tem domínio próprio se
autodomina. Quem não tem é dominado por algo ou por alguém. Quem tem domínio
não permite que sentimentos e desejos o controlem; antes, controla-os, não se
permitindo dominar por atitudes, costumes e paixões.
Domínio próprio,
portanto, é a capacidade efetiva que o cristão deve ter de controlar seu corpo
e sua mente. Quando fez o homem, Deus deu-lhe o privilégio de dominar sobre
todas as coisas:
com que ele tenha
domínio sobre as obras das tuas mãos; tudo puseste debaixo de seus pés”. Salmos
8:6
Esta competência, no
entanto, nem sempre se realiza quando se trata de homem dominar a si mesmo.
Embora possa estar em nós desejar fazer o bem, nem sempre o fazemos. Afinal,
como aprendemos também com Paulo, na nossa carne, não habita bem nenhum, pois o
querer o bem está em cada um de nós; porém, não o efetuá-lo.
“Porque eu sei que em
mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está
em mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o
mal que não quero esse faço”. Romanos 7:18-19
Esta percepção não pode
ser um convite à passividade, mas um desafio a nos conhecermos mais e a nos
esforçarmos mais para viver segundo o padrão de Deus, por difícil que seja.
3 - Desenvolvendo o Autocontrole
Antes, somos convidados
a ter domínio sobre nossos sentimentos, sobre nossos desejos e sobre as
circunstâncias que nos envolvem.
a) Dominando nossos sentimentos
Somos movidos pelos
nossos sentimentos. Se, por exemplo, amamos, a Deus, ao próximo ou a nós
mesmos, somos levados a querer bem, adorando a Deus, respeitando o outro e
gostando de nós mesmos. Se, por outro lado, em nós o ódio é forte, seja a Deus
pela figura do pai que representa, seja ao próximo, por ser a fonte de nosso
sofrimento, seja a nós mesmos, pela incapacidade ser o que gostaríamos de ser,
somos levados ao vale do vazio.
Ter domínio próprio é
fazer com que os sentimentos bons sejam fortalecidos e canalizados para que
possam ser aperfeiçoados. Assim, o amor deve alcançar o seu objeto. Desde
Platão, existe uma modalidade de amor silencioso. Há homens que amam mulheres
que jamais retribuirão o seu amor pelo simples fato de não saberem que sem
amadas. Há pessoas que só Deus, que sonda os corações, sabe que é amado por
ela, porque dos lábios desse tipo de adorador não sai um cântico, não sai uma
palavra de gratidão ou de exaltação a Deus.
Quando temos domínio
sobre o sentimento do amor, fazemos com que ele se torne operativo.
Quando ao ódio, bem,
simplesmente não devemos odiar e poderíamos encerrar a discussão aqui. No
entanto, somos também capazes de odiar; este é um gigante da alma, como o
descreveu um antigo psicólogo (Emílio Mira y Lopez). Se o Espírito Santo habita
em nosso coração, ele não pode conviver com o ódio. Contudo, sabemos que,
embora não o desejando, nós odiamos.
Por isto, a
recomendação bíblica é que, mesmo nos irando, não devemos pecar e nem permitir
que o sol se ponha sobre a nossa raiva. Antes, consultemos nosso travesseiro e
sosseguemos (Salmo 4.4). Em outras palavras, o ódio não pode ser um sentimento
permanente em nós, para que não nos destrua.
“Perturbai-vos e não
pequeis; falai com o vosso coração sobre a vossa cama, e calai-vos”. Salmos 4:4
O ódio é, portanto, um
sentimento a ser controlado ou ele nos dominará e nos levará a fazer o que não
queremos.
A ambição é um
sentimento que também deve ser controlado. Não devemos ser acomodados; antes,
devemos querer o máximo para nós. A ambição destrói quando não vê métodos e se
baseia na comparação com o que os outros são ou alcançaram. Controle a sua
ambição e ela não controlará você.
A vaidade é um
sentimento que também deve ser controlado. Não devemos nos achar que nada
valemos e que os outros são melhores ou fazem as coisas melhores que nós. A
vaidade mata quando nos leva a nos achar onipotentes e oniscientes, acima da
média humana. Controle a sua vaidade e ela não controlará.
b) Dominando nossos desejos
Se os nossos
sentimentos nos definem, nossos desejos nos constituem. Nós somos aquilo que
desejamos. Como ensinou Jesus, onde estiver o nosso tesouro, isto é, os nossos
desejos, aí estará também o nosso coração. (Mateus 6:21)
“Porque onde estiver o
vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”. Mateus 6:21
Desejamos coisas
legítimas e coisas ilegítimas. Nem todos os nossos desejos são pecaminosos.
Sejam quais forem, no entanto, se eles nos controlarem, passam a ser
pecaminosos. Comer chocolate não é pecado. Se no entanto, não posso comê-lo e
não consigo não comê-lo, comê-lo é pecado. Ver televisão não é pecado. Se, no
entanto, eu deixo de fazer o que preciso fazer (seja ler, trabalhar, conversar)
para ficar diante dela, ela me controlou.
Desejamos coisas
realmente necessárias e coisas suavemente impostas. Já não sabemos a diferença
em coisas básicas e coisas supérfluas. De qualquer modo, no entanto, podemos dizer
que grande parte de nossas necessidades simplesmente não existe. É parte da
máquina do mundo, que nos torna primeiramente consumidores e depois cidadãos.
A maior desgraça do
desejo é quando ele se converte em vício. Nada mais blasfemo do que um cristão
viciado. Há cristãos viciados em falar da vida alheia; até reunião de oração se
transforma em espaço privilegiado para a fofoca. São cristãos que não refreiam
as suas línguas. Há cristãos viciados em guardar dinheiro; eles guardam sempre
e de modo tão doentio que nunca usufruem dele. São cristãos que não refreiam
sua cobiça. Há cristãos viciados em mentir; dizem a Deus que O estão adorando,
mas estão apenas buscando uma bençãozinha; dizem que têm apreço por seu irmão,
sendo até capazes de abençoa-los da boca para fora, mas não têm a menor
disposição de ajudá-lo a carregar as suas cargas. São cristãos escravos da
aparência.
c) Dominando-nos diante das Circunstâncias.
Além dos sentimentos e
desejos, que nós podemos controlar, em grau maior ou menor, há as circunstâncias,
aquelas situações que não criamos, mas que nos atingem.
Quando nos enredam,
elas provocam desânimo. Diante delas, podemos perder o auto-controle, partindo
para reações inadequadas, seja de desespero, seja com violência. Nossa reação
mostra que, na verdade, estamos sendo controlados por elas.
Podemos ser menores que
as circunstâncias, mas Deus é maior do que elas. Embora seja difícil, é assim
que devemos crer. Autocontrole é manter a esperança no Senhor da vida.
Precisamos também
aprender a lidar com as circunstâncias. Devemos fazer tudo o que estiver ao
nosso alcance, para mudar aquelas que nós podemos transformar. Diante daquelas
que não podemos alterar, temos que aprender a conviver com elas, mesmo sob
pretexto, para que não nos dominem. Adaptar-se não é aceitar
“conformisticamente” as adversidades, mas saber que elas existem, mudá-las
logo, mudá-las quando for possível e viver apesar delas.
Devemos ter sempre em
mente o conselho do pregador:
“Não há nenhum homem
que tenha domínio sobre o vento para o reter; nem tampouco tem ele poder sobre
o dia da morte; nem há tréguas nesta peleja; nem tampouco a perversidade
livrará aquele que a ela se entrega”. Eclesiastes 8:8
4 - Para Ter Autocontrole
Há certas ocasiões que,
antes de perceber o que está fazendo, você perde o controle, e passa ser vítima
do seu descontrole, velada ou violentamente. Os resultados são prostituição,
impureza, lascívia, que nos sobrevêm quando perdemos o controle sobre a paixão
e nos deixamos levar por ela; idolatria e feitiçarias, quando desesperamos
diante das circunstâncias e perdemos a bênção. O fruto do Espírito, no entanto,
é o auto-controle.
a) Conheça-se e use este Conhecimento a seu
Próprio Favor.
Tendemos a não perceber
como somos, mas devemos nos esforçar para tal. Se você, no trânsito, é um pé de
chumbo, vigie seu comportamento, para que controle o seu ímpeto de sair em
disparada. A velocidade não é mais importante que você. Se você se ira com
facilidade, evite as situações que a provocam a sua raiva. Desenvolva métodos
para que a irritação fique em níveis aceitáveis. Use o que você sabe a seu
próprio respeito para se dominar melhor.
b) Aprenda a tomar Atitudes Diferentes das que
toma Hoje.
Faça com que seus
sentimentos e desejos não redundem sempre nos mesmos atos. Você nasceu assim,
mas não precisa morrer assim. Abra-se para o diferente. Faça o que nunca fez
antes.
c) Valorize a Disciplina.
Quando Jesus disse que,
se o nosso olho nos levar ao escândalo, devemos arrancá-lo, ele estava
lembrando que precisamos subjugar o nosso corpo, quando este nos subjuga. Ponha
objetivos na vida e se empenhe para alcançá-los. O autocontrole é o resultado
da disciplina e do esforço próprio.
d) Deixe-se conduzir pelo Espírito de Deus.
O domínio próprio é um
esforço de quem vive pelo Espírito. Os homens em geral não pensam em
disciplina, mas nós, cristãos, esforçamos para viver de modo organizado,
coordenado e harmônico. Neste ministério, o Espírito Santo quer nos apoiar,
para nos conduzir. Deixe-se dirigir pelo Espírito. O domínio próprio só é
possível por meio de Sua ação em nós.
5 - Conclusão
O domínio próprio a que
estamos nos referindo aqui não se trata de um autocontrole que nos faz doentes,
aquele falso, aquele apenas de aparência, mas aquele resultante de desejo
profundo.
Por isto, evite começar
a fazer aquilo que o controla. Se você perde o controle da sua língua, quando o
assunto é a vida alheia ou quando a conversa descamba para assuntos pouco
edificantes, não entre na conversa. Recuse participar desde o princípio.
Se já começou,
deixando-se dominar por sentimentos, desejos e atitudes, procure parar. O
Espírito Santo o ajudará, se houver arrependimento no seu coração.
Afinal, a vida cristã é
aquela vivida no Espírito Santo. Na verdade, a vida cristã só é possível no
Espírito. Fora dele, nossa vida é como a de qualquer pessoa...
Bispo. Capelão/Juiz.
Mestre e Doutor em Ciência da Religião Dr. Edson Cavalcante
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