IMAGEM E SEMELHANÇA " A CRIAÇÃO DO HOMEM ".
O homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. Isto significa que o homem é parecido com Deus ao passo de que, diferentemente de qualquer outra criatura, ele é portador de Sua imagem (Gênesis 1:26).
Muitas pessoas possuem algumas dúvidas sobre o verdadeiro significado da expressão “imagem e semelhança de Deus”. De fato essa expressão representa alguns desafios de interpretação. Então, neste estudo, iremos refletir sobre qual é a doutrina bíblica sobre este tema.
O que é ser à imagem e semelhança de Deus?
Quando a Bíblia diz que o homem é a imagem e semelhança de Deus, ela não quer dizer exatamente que somos fisicamente parecidos com Deus. Deus é Espírito e não possui um corpo como o nosso (João 4:24).
Apesar disso, devemos entender que o homem, em todo o seu ser, é a imagem e semelhança de Deus, de modo que sua plena constituição, material e imaterial (corpo e alma/espírito), representa a Deus. O homem é uma criatura racional, pessoal, criativa e moral, com quem o próprio Deus compartilha seus atributos comunicáveis. Ele possui vida proveniente de Deus e potencial para se relacionar com Ele.
Assim, os seres humanos são capazes de: expressar vontades; tomar decisões; avaliar situações; demonstrar emoções; pensar de forma lógica e racional; exercer domínio; possuir responsabilidades e criar coisas incríveis.
Com base neste conceito, podemos notar algo muito interessante. Muitas pessoas pensam que quando a humanidade desenvolve algum avanço significativo na área da ciência, por exemplo, isso implica numa independência cada vez maior de Deus. Na verdade muitas pessoas acreditam nisso, e até utilizam tais avanços para contestarem a existência do próprio Deus. Mas na verdade, é exatamente o contrário disto. Cada coisa grandiosa que o homem desenvolve, necessariamente reflete a verdade de que ele foi criado à imagem e semelhança de Deus.
Existe alguma diferença entre “imagem” e “semelhança”?
Algumas pessoas tentam estabelecer diferenças entre “ser à imagem de Deus” e “ser à semelhança de Deus”. Todavia, as palavras “imagem” e “semelhança” são sinônimas. Na Bíblia elas são aplicadas para se referir ao mesmo significado.
Os termos hebraicos tselem e demuch são traduzidos como “imagem” e “semelhança” respectivamente. Apesar da Septuaginta (versão grega do Antigo Testamento) e a Vulgata (versão latina da Bíblia), inserirem um “e” entre essas duas expressões, na frase em hebraico não existe nenhuma conjunção entre essas palavras. Isto significa que no original lemos: “à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”.
É muito fácil notar que não há diferença entre “imagem” e “semelhança” nesse sentido no texto bíblico. Isto pode ser percebido quando analisamos alguns versículos do próprio livro de Gênesis. O autor bíblico utiliza essas duas palavras de forma intercambiável.
Gênesis 1:26 é a primeira vez que o conceito de que o homem é a imagem e semelhança de Deus aparece nas Escrituras. No versículo seguinte, 27, apenas a palavra “imagem” é usada. Já em Gênesis 5:1, o autor do livro resolveu utilizar apenas a palavra “semelhante”. Por fim, em Gênesis 9:6, mais uma vez aparece apenas a palavra “imagem”.
Com isto, podemos perceber que ambas as palavras são utilizadas indistintamente, como sinônimos. Logo, devemos entender que a expressão “à semelhança de Deus” é apenas outra maneira de se dizer que “somos criados à sua imagem”.
Mesmo ficando claro que essas expressões são sinônimas, é possível que talvez o autor de Gênesis tenha usado essa repetição particularmente em Gênesis 1:26, para garantir que as pessoas compreendessem algo muito importante. Apesar do homem ser criado à imagem de Deus de modo algum ele é divino. Em outras palavras, o homem é uma representação de Deus, mas não é um semideus. O homem reflete sua imagem, na medida em que é semelhante a Ele em alguns aspectos.
O homem perdeu a imagem e semelhança de Deus após o pecado?
Esse talvez seja o assunto mais discutido dentro do conceito de imagem e semelhança de Deus. Algumas pessoas tentam fazer uma distinção significativa entre as palavras “imagem” e “semelhança”. Então elas afirmam que o homem perdeu a imagem de Deus, e não a semelhança, e vice-versa. Todavia, como vimos no tópico anterior, não há qualquer possibilidade de fazer uma distinção nesse sentido.
Nos resta então afirmar ou que o homem perdeu a imagem e semelhança de Deus ou que não a perdeu. Poucos teólogos na história da Igreja Protestante afirmaram que o homem perdeu a imagem e semelhança de Deus após a Queda.
Martinho Lutero foi um destes poucos teólogos. Sua posição sobre esse assunto era bastante inflexível. Sua percepção sobre as qualidades do homem, sobretudo em aspectos morais após o pecado, era bastante negativa. Na verdade seu posicionamento era bem mais radical do que a posição de outros reformadores, como João Calvino, por exemplo.
Mas a doutrina bíblica sobre isso é bastante clara. As Escrituras afirmam categoricamente que após a Queda, o homem continuou sendo a imagem e semelhança de Deus.
Em Gênesis 1:26, antes da Queda, vimos que o homem é denominado como sendo a imagem e semelhança de Deus. Já em Gênesis 5:1, agora após a Queda, o homem continua sendo designado como a imagem de Deus.
Ainda em Gênesis 9:6, lemos que atentar contra a vida de um homem é um pecado grave, pois Deus o fez à sua imagem. Em outras palavras, o homicídio não apenas tira a vida de alguém, mas é um atentado contra a imagem do próprio Deus ali representada. Por isto, segundo o texto bíblico, a punição também deveria ser a pena capital.
Saindo do livro de Gênesis, o Salmo 8, mesmo de forma implícita, revela que o homem caído ainda é portador da imagem de Deus. Quando partimos então para o Novo Testamento, esse ensino fica ainda mais claro.
A passagem bíblica mais direta e explicita sobre esse princípio está em Tiago 3:9. Nesse texto somos exortados a respeito do erro em amaldiçoar alguém, pois os homens “foram criados à semelhança de Deus”. Em outras palavras, o ensino bíblico nesse capítulo é que quando maldizemos alguém, indiretamente estamos maldizendo o próprio Deus, pois o homem reflete a sua imagem.
Logo, tanto do ponto de vista do Antigo quanto do Novo Testamento, o homem, mesmo após a Queda, traz consigo a imagem de Deus. Se o homem tivesse perdido essa imagem, não faria qualquer sentido os escritores bíblicos continuarem se referindo ao significado e importância desse ensino revelado nos primeiros parágrafos das Escrituras.
Além do mais, em Gênesis 5:3 lemos sobre o nascimento de Sete, onde a expressão “imagem e semelhança” aparece novamente. Porém, dessa vez, ela se refere ao fato de que Adão teve um filho à sua imagem e semelhança.
Quando nos é dito que Sete era imagem e semelhança de Adão, também podemos entender que a imagem de Deus continuou a ser impressa na humanidade através do ato da procriação que representa uma continuidade do ato criador de Deus. Isto significa que se Adão foi criado à imagem e semelhança de Deus, e Sete, por sua vez, nasceu à imagem e semelhança de Adão, logo Sete também possuia a imagem de Deus.
Portanto, Gênesis 5:3 estabelece uma correlação verbal com Gênesis 1:26-28. Todavia, da mesma forma com que a imagem de Deus continuou a ser transmitida a cada ser humano, a corrupção da natureza de Adão após a Queda também foi transmitida a cada um dos homens. Isto nos leva a outra verdade presente nas Escrituras: após a Queda, a imagem de Deus no homem foi desfigurada.
A imagem e semelhança Deus no homem foi desfigurada
Deus criou o homem de forma perfeita, irrepreensível, com caráter puro e sem contaminação. Porém, o pecado distorceu e maculou essa imagem, deformando o seu caráter. Antes da Queda o homem era verdadeiramente livre, isto é, não estava contaminado pelo pecado.
Porém o homem pecou, e a imagem de Deus foi manchada, maculada, desfigurada e completamente deteriorada. Ele se tornou incapaz de produzir qualquer justiça própria que o credencie a salvação. Assim, o pecador continua sendo o ser criado à imagem e semelhança de Deus, visto que essa é a base da dignidade ordenada divinamente presente em todo ser humano. Mas essa imagem está fracionada e desfigurada pelo pecado.
Em alguns, essa imagem se apresenta de forma um pouco mais precisa. Já em outros, a imagem de Deus parece estar bem mais distorcida. Mas em ambos os casos, a imperfeição moral da humanidade é revelada. A compreensão desse princípio, juntamente com a noção da graça comum que Deus derrama sobre a humanidade, explica o fato de muitos incrédulos demonstrarem, por exemplo, bondade, caridade, lealdade e as mais variadas boas ações.
Mesmo o pecador estando escravizado pelo pecado, a imagem de Deus, ainda que distorcida, está impressa nele. Por isso ele pode produzir coisas boas em seu convívio com a sociedade, no uso de suas habilidades criativas e intelectuais, e até mesmo na esfera moral. Obviamente a maioria dos seres humanos não é tão má quanto poderia ser.
O homem é a imagem e semelhança de Deus, e essa característica não pode ser separada de sua natureza. Porém por esta mesma natureza ter sido corrompida, a imagem de Deus no homem foi fatalmente atingida e desfigurada.
A imagem e semelhança de Deus restaurada no homem
Vimos que o homem ainda é imagem e semelhança de Deus, porém numa versão pálida, distorcida e corrompida pelo pecado. Também vimos que por si mesmo homem algum pode recuperar a imagem perfeita e imaculada com a qual foi criado originalmente.
A boa notícia é que a Palavra de Deus nos revela que essa qualidade danificada pelo pecado é em Cristo restaurada (Romanos 8:29). Cristo é a perfeita imagem do próprio Deus (Colossenses 1:15). Ao nascer de novo, a imagem de Deus no homem começa a ser reconstruída, de modo que o verdadeiro seguidor de Cristo torna-se como Ele “em justiça e retidão” (Efésios 4:24).
Sobre o cristão como sendo a imagem e semelhança de Deus, talvez a melhor definição seja dizermos que quando o homem é regenerado, ele passa a ser a “imagem redimida de Deus”. O apóstolo Paulo escreve exatamente sobre isto. Ele diz que o cristão genuíno se reveste do novo homem “que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Colossenses 3:10).
Esse processo de restauração da imagem de Deus que ocorre nos santos é um processo progressivo e contínuo. Ele alcançará sua plena realização apenas no dia vindouro do maravilhoso retorno de nosso Senhor. Nesse dia seremos a perfeita imagem e semelhança de Cristo. Diante dele, nós nos encontraremos profundamente extasiados, admirando o esplendor daquele que nos resgatou. Nesse momento, a imagem de Deus terá sido completamente restaurada em nós.
Apóstolo. Capelão/Juiz. Mestre e Doutor em Ciências da Religião Dr. Edson Cavalcante.
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