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domingo, 29 de setembro de 2019

O DESESPERO DE UM PAI


O DESESPERO DE UM PAI
Diz o nosso texto que Jairo era “um dos principais da sinagoga”, ou seja, tinha uma posição de respeito, certamente não teria chegado a tal posição na hierarquia entre os judeus se não demonstrasse qualificações intelectuais e morais. Era visto, portanto, como homem de exemplo. Um líder religioso que conhecia a Palavra de Deus e buscava praticá-la. Provavelmente auxiliava no serviço religioso no sábado, bem como no oficio do ensino e administração de finanças e justiça durante a semana. Mas além desta posição de destaque, Jairo era pai. E, ao que tudo indica, pelo uso do grau diminutivo “filhinha”, um pai zeloso e carinhoso, disposto, inclusive, a arriscar sua posição social indo ao encontro de Jesus para ver sua filha curada. Enfim, a família de Jairo é o protótipo daquilo que comumente chamamos de um lar estável: posição religiosa e social de destaque, bons costumes, boa moral.
 
Entretanto, a estabilidade de um lar não garante que a família não passará por dificuldades e tribulações. No caso da família de Jairo, a tribulação era a enfermidade da filha que não tinha cura. Podemos perceber no texto (vv.22 e 23) três ações de Jairo em busca da cura para a filha. A primeira delas diz respeito ao fato de Jairo ir ao encontro de Jesus. Ele coloca sua reputação em jogo - certamente seria questionado pelos irmãos da sinagoga. Ainda assim ele arrisca tudo para ver sua filhinha curada. Ele vai até Jesus do qual ouviu falar. Como segunda ação, Jairo adora a Cristo. O ato de se jogar aos pés de alguém é o ato de prostrar-se, ou seja, ato de adoração que um judeu, especialmente na posição de Jairo, não faria de maneira leviana. Jairo procedeu desta maneira por conta do desespero que se apoderava dele, ou por acreditar e estar convencido que Jesus era mais que um profeta. E, como terceira ação, Jairo não somente adora a Cristo, mas suplica insistentemente. A súplica é a oração de extrema necessidade. Suplicamos quando não temos mais esperança de encontrar socorro de outra forma. Jairo suplica pela sua filhinha. Note que Jairo, diferente do que ouvimos em cultos e palestras televisivas, não determinou, não decretou, nem proclamou ou liberou a fé. Jairo simplesmente suplicou. Afinal, uma oração nunca pode ser substituída por qualquer demonstração de obras humanas perante Deus, mas ela é somente o entregar-se à graça e misericórdia de Deus.
 
Jesus então inicia o percurso em direção à casa de Jairo. Contudo, a caminhada é interrompida e prolongada por uma mulher enferma que é curada e, consequentemente, com a demora, a filha de Jairo morre. Ao final, Jesus chega até a casa de Jairo e a menina é reavivada. Podemos aprender pelo menos duas coisas muito importantes deste episódio:

1°- sobre a fé pessoal/individual. A fé é entrega passiva, absoluta e incondicional. Fé não é um ato da vontade humana. A fé em Jesus acontece quando não temos mais onde e nem mesmo em quem nos agarrar. A fé só tem espaço quando o orgulho está morto. O orgulho do homem natural tem que cair para que a fé, que é dádiva de Deus, tenha espaço. O evangelho de Marcos mostra Jairo sendo “desinstalado” de sua vida tranquila e segura. São dois os momentos. O primeiro deles é o sofrimento pessoal de Jairo com a grave enfermidade de sua filha, situação que o motiva a se prostrar e suplicar a Jesus como sua última alternativa. Como segundo momento, convido a imaginarmos a aflição e o desespero de um pai que tem uma filha morrendo em casa e, já tendo encontrado o remédio, tarda a chegar. É o que aconteceu quando uma mulher que sofria de hemorragia interrompeu o percurso da caminhada até a casa de Jairo tocando nas vestes de Jesus e recebendo a cura. Jesus, por sua vez, percebendo que dele havia saído poder ainda se demorou conversando com a mulher curada até vir a noticia de que a filha de Jairo havia falecido. Quanto sofrimento e desespero! Jesus então desafia Jairo: “Não tenha medo, tenha fé”. Como Jairo, não importa quem sejamos, deixemos o orgulho e a arrogância de nossa posição pessoal, profissional e social, e levemos a nossa dor aos cuidados do Cristo. Ele ouvirá e ajudará com o melhor. Afinal, por este texto, percebemos que nossas dores, independente de quais forem, tem o propósito de nos levar a Cristo e a, mais do que compreender, viver a fé existencialmente.

2°- sobre a fé comunitária. Jesus não foi sozinho à casa de Jairo, levou consigo três discípulos (em solidariedade à dor e em fé) e, ao entrar e ver aquela confusão geral com pessoas chorando alto e gritando, pede que todos se retirem ficando somente os discípulos, Jairo e sua esposa. Jesus então toma a menina pela mão e lhe diz “Talita cumi”, ocorrendo o milagre do reavivamento. Isto nos serve de lição. Quando formos realizar nossas visitas de aconselhamento e consolação tomemos como exemplar a atitude de convidar outros irmãos e irmãs, de fé testada e provada pelas tribulações da vida, para irem conosco e em solidariedade ao que sofre colocar esta dor aos cuidados de Jesus em oração. A fé é recebida individualmente, mas vivida e exercitada comunitariamente. São emblemáticas as palavras do  “Esse é o papel da comunidade cristã: testemunhar o Cristo que compartilha a dor, que a absorve, desce lá onde ela está e faz o resgate. Portanto, como Comunidade precisamos nos solidarizar com os sofridos. Mas é muito importante exercer esse papel de Cristo, o de descer até lá onde a dor se encontra. Vale lembrar que nem sempre a dor é física. Ela pode ser psíquica, pode ser dor de rejeição social, pode ser de discriminação. Ser discípulo de Cristo significa descer até o mais profundo ponto da dor e ali mostrar a presença da oportunidade de vida....”
 
Portanto, um lar estável, de bons costumes e boa moral, como são os lares onde vivemos, também precisa da solidariedade do Cristo que compartilha e absorve a dor, resgatando a pessoa de sua miséria, sofrimento e pequenez. A história de Jairo é inspiradora para a fé. Aprendamos com Jairo!
Apóstolo. Capelão/Juiz. Mestre e Doutor em Ciências em Religião Dr. Edson Cavalcante

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