A TRIBULAÇÃO
O período escatológico chamado de “Tribulação” é uma época sem precedentes na história humana (Mt 24.21), sendo o período de 7 anos identificado como a 70ª semana de Daniel.[1] O sofrimento infligido nesse período terá abrangência mundial (Ap 3.10). Isso torna a Tribulação um evento ímpar no estudo teológico.
1 – O INÍCIO DA TRIBULAÇÃO
- O início desse período se dará quando “um príncipe que há de vir” (Dn 9.26) fizer “firme aliança com muitos” (Dn 9.27). Tal homem também é identificado, em outras partes, como o “chifre pequeno” (Dn 7.8,24,25) e como “homem da iniquidade” (2Ts 2.3);
- Ele, que liderará uma coalizão de nações ocidentais naqueles dias, fará também uma aliança com Israel trazendo paz aos judeus. Devido a essa paz, o Templo será reconstruído na primeira parte da Tribulação (Dn 9.27 prevê que na primeira metade da Tribulação haverá “sacrifícios” em Israel, atividade feita exclusivamente no Templo);
- Os primeiros 3½ anos terminarão com o “homem da iniquidade” declarando ao mundo sua divindade e se “assentando no santuário de Deus” (2Ts 2.4), possivelmente uma referência ao Templo de Israel.
2 – OS JUÍZOS
Apocalipse 6–19, texto que trata do período da Tribulação, descreve três sequências de juízos: selos, trombetas e taças, cada um em número de sete eventos. Se as três sequências se sucedem cronologicamente, se elas se sobrepõem, ou, ainda, se as trombetas e as taças são descrições dos selos, isso é matéria para muita discussão e muitas dúvidas.
A) Os selos
1) Primeiro selo (Ap 6.1,2): cavaleiro no cavalo branco que sai para conquistar. Pode indicar, bem no início da Tribulação, o domínio crescente do poder do “homem da iniquidade”. Esse domínio acontece bem quando as pessoas falam em “paz e segurança” (1Ts 5.3);
2) Segundo selo (Ap 6.3,4): cavaleiro no cavalo vermelho portando uma grande espada, trazendo o fim da paz e guerra entre os homens;
3) Terceiro selo (Ap 6.5,6): cavaleiro no cavalo preto com uma balança na mão, a qual representa um forte racionamento de comida devido a uma fome rigorosa.
4) Quarto selo (Ap 6.7,8): cavaleiro, chamado Morte, no cavalo preto. Ele traz morte, por meio da guerra, fome e pestes, a 1/4 da população mundial;
5) Quinto selo (Ap 6.9-11): iniciam-se a perseguição e o martírio daqueles que testemunharam o nome de Cristo na Terra.
6) Sexto selo (Ap 6.12-17): haverá eventos catastróficos como um grande terremoto, o escurecimento do Sol e da Lua, chuva de meteoros, montes e ilhas removidos do lugar e algo nos céus que dará aos homens a ideia nítida do juízo que Deus lhes envia;
7) Sétimo selo (Ap 8.1-6): Um grande silêncio, por meia-hora, seguido por trovões e terremotos que introduzem os sete juízos denominados “trombetas”.
B) As trombetas
1) Primeira trombeta (Ap 8.7): fogo misturado a sangue cai do céu e queima 1/3 da terra, das árvores e das plantas;
2) Segunda trombeta (Ap 8.8,9): algo de natureza inexplicável causa a destruição de 1/3 do mar, da vida marinha e das embarcações.
3) Terceira trombeta (Ap 8.10,11): 1/3 da água potável é afetado trazendo grande sede e morte aos homens;
4) Quarta trombeta (Ap 8.12,13): danos causados ao Sol, à Lua e às estrelas provocando perda de luz para a Terra tanto de dia como de noite;
5) Quinta trombeta (Ap 9.1-12): primeiro “ai”. Difícil de definir do que exatamente se trata o abismo e os gafanhotos, visto que Ap 9 é o capítulo que mais contém a palavra “como”, introduzindo símiles no lugar de uma descrição literal dos fatos. De qualquer modo, haverá, por 5 meses, um tormento indescritível sobre os incrédulos;
6) Sexta trombeta (Ap 9.13-21): segundo “ai”. Haverá a morte de 1/3 da população mundial.[2]
7) Sétima trombeta (Ap 11.15-19): Terceiro “ai”. Há um anúncio de que o fim está próximo e que é chegado o momento do Senhor reinar na Terra. Mesmo assim, ainda haverá 7 taças da ira de Deus a serem derramadas, talvez, nas últimas semanas da Tribulação (Ap 16.1-21), sendo que todas as taças são derramadas ao mesmo tempo sobre a Terra (Ap 16.1).
C) As Taças
1) Primeira taça (Ap 16.2): feridas terríveis acometem os incrédulos;
2) Segunda taça (Ap 16.3): destruição do mar e morte completa dos seres marinhos;
3) Terceira taça (Ap 16.4-7): toda a água potável será afetada trazendo um juízo tremendo pelo sangue dos justos que foi derramado;
4) Quarta taça (Ap 16.8,9): a intensidade dos raios solares é tão grande que passa a queimar os homens;
5) Quinta taça (Ap 16.10,11): algo descrito como “o trono da besta será afetado e seu reino ficará em trevas” causará ódio ainda maior dos incrédulos por Deus;
6) Sexta taça (Ap 16.12-16): o rio Eufrates secará. De certo modo, isso facilitará a travessia dos exércitos dos reis do Oriente (cf. Dn 11.44);
7) Sétima taça (Ap 16.17-21): completam-se todas as coisas e ocorre o maior terremoto de todos os tempos causando inúmeras destruições. Caem dos céus, também, pedras de cerca de 35 quilos provocando terrível destruição e blasfêmias contra Deus por parte dos incrédulos.
3 – OUTROS EVENTOS DA TRIBULAÇÃO
A) Os remidos
Quando o quinto selo é aberto (Ap 6.9-11) iniciam-se a perseguição e o martírio daqueles que testemunharam o nome de Cristo na Terra. Sabendo que todos os crentes foram arrebatados antes da Tribulação, podemos notar esses que serão perseguidos crerão em Cristo durante aquele período.
Portanto, o evangelho será pregado nessa época possivelmente pelos servos de Deus que foram selados. Trata-se de 144 mil judeus solteiros do sexo masculino (Ap 7.3-8; 14.1-4) e são chamados de “servos do nosso Deus”.
Eles certamente não serão os únicos a pregar naqueles dias. Outros pregarão e serão perseguidos e mortos (Mt 24.9).[3] Mesmo assim, o evangelho será pregado por toda parte e haverá conversões (Mt 24.14).
B) Ataque frustrado a Israel
Durante o período de aparente paz (provavelmente no final dele), uma confederação do norte atacará Israel (Ez 38–39). Os possíveis participantes, segundo Ez 38.1-6, são Rússia (Gogue e Magogue), Irã (Pérsia), Sudão (Etiópia), Líbia (Pute), Ucrânia (Gômer), Turquia e Síria (Togarma). Esse ataque ocorrerá depois do tratado de paz, quando os israelitas habitarem sua terra tendo retornado do exílio mundial. Haverá protestos da parte do Ocidente e da Arábia Saudita (Ez 38.13).[4] Essa coligação será derrotada por intervenção divina (Ez 38.21,22) e levará 7 meses para enterrar os mortos (Ez 39.12). Tal destruição dos inimigos causará um grande testemunho para o mundo e para os israelitas incrédulos (Ez 38.23; 39.7,13,21-24). É possível que esse evento tanto traga o “homem da iniquidade” para atuar dentro da Palestina como produza conversões entre os israelitas e a consequente perseguição do “homem da iniquidade” por desejar uma adoração que não pode mais ter devido à fé dos que creram.
C) As duas testemunhas
Durante a primeira metade da Tribulação, duas testemunhas desenvolverão uma atividade de proclamação como de profetas (Ap 11.3-13). Farão isso por 1.260 dias (primeiros 3½ anos da Tribulação) e parecem exercer poder sobre a natureza (vv.3-6). Cumprida sua tarefa e seu tempo, a besta (o homem da iniquidade) vai vencê-las e deixar seus corpos expostos em uma praça de Jerusalém (vv.7-9). Durante 3 dias e meio, haverá festa pela morte das testemunhas, mas, ao final disso, elas serão ressuscitadas e levadas ao céu. Um décimo da cidade será destruído causando a morte de 7 mil pessoas (vv.10-13).
D) Atuação do homem da iniquidade (a besta)
A primeira parte da Tribulação tem o “homem da iniquidade” como um líder capaz de resolver problemas entre nações trazendo-lhes paz. Entretanto, o evento descrito em Dn 9.27 demonstra seu real caráter e dá início à segunda metade da Tribulação.
A partir de então, a besta se assentará no santuário de Deus e como Deus se apresentará, exigindo ser adorado (2Ts 2.3,4). Não é sem motivo que a besta se apresentará como Deus, pois Satanás lhe dará poder e autoridade (Ap 13.2), além de poderes sobrenaturais (2Ts 2.9). Durante essa época, a besta será “ferida de morte”, mas sua recuperação inacreditável fará com que seja seguida por muita gente, que também adorará a Satanás (Ap 13.3,4).
Na sequência, nos próximos 42 meses (3½ anos), a besta agirá com poder e engano, perseguindo e vencendo os crentes e sendo adorada pelo mundo todo (Ap 13.5-8). Haverá também, por parte do homem da iniquidade e das nações que o servem, a perseguição e destruição da igreja apóstata/ecumênica (Ap 17.16).
E) A segunda besta (falso profeta)
Para promover seus intentos e a adoração a si, a primeira besta (o homem da iniquidade) faz surgir uma segunda besta (falso profeta). A segunda besta em momento algum promove a si mesma, mas ao homem da iniquidade (Ap 13.11-18). Tem a autoridade da primeira besta e realiza sinais (vv.12,13). Vai exaltar o fato de a primeira besta não ter sucumbido diante da ferida mortal (v.14).[5] Fará uma imagem da besta e lhe dará vida (ou a aparência de uma imagem viva) a fim de atrair adoração (v.15). Finalmente, cria uma marca que somente os adoradores da besta receberão e com a qual poderão realizar operações comerciais (vv.16-18).
F) A igreja apóstata/ecumênica
No período da Tribulação, atuará uma igreja apóstata (será disso que trata a apostasia de 2Ts 2.3?) chamada de grande meretriz.[6] Apocalipse 17 fala sobre tal igreja demonstrando se tratar de uma instituição rica (v.4), modelo de outras instituições ligadas a ela (v.5), que se alegra com a perseguição e morte das testemunhas de Jesus (v.6). Essa instituição tem uma abrangência mundial (v.15) e sucumbirá diante do homem da iniquidade e das nações a ele associadas (v.16).
4 – O ARMAGEDOM
No final da Tribulação, reinos do Norte e do Leste virão sobre Israel, facilitados pela seca do Eufrates, à planície de Esdraelon, defronte ao monte Megido (do hebraico har megiddô). Trata-se de um vale que mede cerca de 30 x 20 km. Outros locais de conflito serão Jerusalém (Zc 12.9; 14.12; 14.4) e Bozra – atual Petra – (Is 63.1-6). Essas três regiões compreendem o Norte, o Centro e o Sul de Israel, respectivamente.
No meio da batalha, o Senhor Jesus voltará com seus exércitos celestiais e derrotará os exércitos terrenos (Ap 19.11-21). O morticínio será indescritível (Ap 14.20; 19.17,18).
[1] Alguns textos que favorecem a ideia de que esse período, chamado por Daniel de “semana” é, na verdade, um período de 7 anos e não de 7 dias são Dn 7.25; 12.7,11-12 e Ap 11.2,3; 12.6,14; e 13.5, referindo-se a uma parte da Tribulação como um período de 3 anos e meio. Mediante Dn 12.11, sabendo que 1.260 dias são iguais a 3 1/2 anos, os 30 dias para completarem os 1.290 dias provavelmente correspondem ao tempo necessário para todos os julgamentos que acontecerão depois da Segunda Vinda – Ez 20.33-44; Jl 3.2,3; Mt 25.32 – e os 45 dias que completarão os 1.335 dias provavelmente correspondem ao tempo que precederá o início do reino milenar.
[2] No 4º selo, a morte vem a 25% da população, restando apenas 75%. Na 6ª trombeta morrem 1/3 dos 75%, ou seja, outros 25%. Somando o 4º selo com a 6ª trombeta, 50% da população que adentra a Tribulação estará morta por meio desses dois juízos. Levando em conta as mortes, mesmo que menos numerosas, causadas pelos outros selos e trombetas, mais da metade da população mundial estará morta depois da 6ª trombeta.
[3] Notar que Mt 24.6-8 parece descrever a metade da Tribulação.
[4] Sabá e Dedã são terras na região da Arábia Saudita (Is 21.13; 60.6, cf. Gn 25.3).
[5] Um dos pontos da pregação cristã visando à adoração de Jesus como Deus é a apresentação da ressurreição do Senhor como sinal da sua divindade. É possível que a segunda besta utilize esse evento do mesmo modo.
[6] É comum nas Escrituras a adoração falsa ou voltada a outros deuses ser nomeada de “prostituição” e “adultério”.
Apóstolo. Capelão/Juiz. Mestre e Doutor em Ciências da Religião Dr. Edson Cavalcante
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