ESTUDO BÍBLICO APRENDENDO COM A MORTE
DO PROFETA ELISEU...
“E sucedeu que, enterrando eles um homem, eis que viram um bando e
lançaram o homem na sepultura de Eliseu; e, caindo nela o homem e tocando os
ossos de Eliseu, reviveu e se levantou sobre seus pés” (2 Rs
13.21).
INTRODUÇÃO
Na lição de hoje, acompanharemos os últimos momentos da vida deste
gigante da fé que foi o profeta Eliseu. Aprenderemos com sua velhice,
enfermidade e morte algumas lições sobre a brevidade da vida terrena e as
vicissitudes por que todos os mortais estão destinados a passar: nascer,
crescer e morrer, independente da posição espiritual que ocupa. Veremos também
qual propósito de Deus em realizar o último milagre por meio do profeta Eliseu
quando este já estava morto e qual o inestimável legado deixado pelo profeta de
Abel-meolá.
I. A DOENÇA TERMINAL DE ELISEU
A vida é o dever que trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são
seis horas. Quando se vê, já é sexta-feira! Quando se vê, já é natal! Quando se
vê, já terminou o ano! Quando se vê, já se passaram cinquenta anos (...). Mário Quintana.
1. A velhice de Eliseu, sua
doença e sofrimento.
Cerca de cinquenta anos haviam se passado desde que o jovem Eliseu fora
escolhido para suceder Elias. Meio século de ministério frutífero havia
impactado nada menos que quatro nações: Israel, Judá, Moabe e Síria, ministério
diferenciado por manifestações extraordinárias do poder Deus. “Mas o tempo”,
frase que costumamos ouvir das pessoas no dia-a-dia, “passa rápido” e Eliseu já
tinha cerca de oitenta anos. A velhice havia chegado para o profeta, e com a
velhice os problemas e saúde, o sofrimento e a iminência da morte.
Com a velhice a doença e o sofrimento. A Bíblia afirma que Eliseu
encontrava-se doente de sua doença de que morreu, passando por sofrimento
tamanho que comoveu o coração de Joás, rei de Israel. “E Joás, rei de Israel
desceu a ele, e chorou sobre o seu rosto, e disse: “Meu pai, meu pai, carros de
Israel e seus cavaleiros!” O grande profeta de Israel experimentou plenamente
as agonias próprias do envelhecimento e morte, fato comum a todos os mortais.
1.1 A experiência de Eliseu nos
mostra que, por mais nobres e grandes que os homens sejam, eles não se livram
de sua condição de mortais. Homem de reputação irrepreensível, Eliseu gozava de comunhão
singular com Deus evidenciada nos milagres que realizou, sempre em favor de
pessoas extremamente necessitadas. De fato, Eliseu foi um homem singular na
história de Israel. Pessoas assim são amadas, reverenciadas e idealizadas como
se fossem sobre-humanas, e soa inconsequente que elas passem pelo mesmo
processo natural da vida por que passam o comum dos homens. Mas, via de regra,
a velhice e a doença chegam para todos, e com a doença a morte.
Lembro-me de um colega que precisava apresentar um trabalho acadêmico
diante de grandes vultos do saber de uma renomada universidade de São Paulo. Na
hora da apresentação, o seu temor e nervosismo se faziam perceber nos tremores
de suas mãos. Um amigo dele se aproximou e cochichou no seu ouvido: “Não
esqueça que seus avaliadores são da mesma espécie que você. Eles e nós temos
muita coisa em comum, acredite”. Pois é isso mesmo. Por maior que seja o
homem, por incríveis que sejam as suas realizações, ainda são meros mortais fadados
à lei inexorável do processo natural da vida: nascemos, crescemos e morremos. A
grande diferença está no como vivemos e não no como
morremos. Como bem lembra o pastor José Gonçalves, “às vezes idealizamos de
tal forma os homens de Deus que acabamos nos esquecendo de que eles também são
humanos. Envelhecem, adoecem e também morrem. Eliseu fora um grande homem de
Deus e ainda era nos dias de sua enfermidade, mas ainda assim era um homem”.
1.2 A experiência de Eliseu nos
alerta sobre a brevidade da vida e a eternidade de Deus.“Quanto ao homem, os
seus dias são como a erva, como a flor do campo assim floresce. Passando por
ela o vento, logo se vai, e o seu lugar não será mais conhecido.” (Salmo
103.15-16).
“Faze-me conhecer, Senhor, o meu fim, e a medida dos meus dias qual é,
para que eu sinta o quanto sou frágil” (Sl 34.9).
“Lembra-te também do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que
venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais venhas a dizer: Não tenho
neles contentamento” (Eclesiastes 12.1).
Os homens de todas as épocas e lugares se debateram
com a angústia de pensar sobre a rapidez com que a vida passa. Por outro lado,
a coletânea de pensamentos que nos legaram sobre a própria finitude é uma
advertência contra a tentação de nos esquecermos desta realidade: A vida passa
muito rapidamente. Tiago a comparou a um simples vapor (Tg 4.14), o profeta
Isaías à erva do campo (Is 40:6), o rei Davi a comparou a um sopro (Sl 144.4),
e Moisés a compara a um conto ligeiro (Sl 90:9,10).
Mas em contraste com a brevidade da vida humana, há uma eternidade que
se desenrola por trás das cortinas da existência terrena. A Bíblia afirma que
Deus colocou a eternidade no coração do homem (Ec 3.11). Cada dia vivido aqui
nos põe mais perto do fim desta dimensão e nos projeta para mais perto da
eternidade (ver 2Co 5.1; 1Jo 2.7). A maneira como vivemos esta vida, como
gastamos nossos dias e talentos, como nos relacionamos com Deus determinará o
estado de nosso futuro eterno. Eliseu foi um grande exemplo de alguém que em
sua curta existência viveu para servir a Deus a ao próximo.
II. A PROFECIA FINAL DE ELISEU
1. A ação de Deus na profecia. É muito comum vermos nos cultos
pentecostais de hoje uma onda de otimismo que leva ministros a profetizarem
toda sorte de bênçãos e vitórias sobre os fiéis da igreja, principalmente sobre
aqueles que mais contribuem financeiramente com os projetos da igreja. Muitos
usam como referencial o relato bíblico em que Elias profetizou que não choveria
em Israel “segundo a minha palavra”, disse o profeta. Já ouvi muitos
pregadores, num arroubo de emoções, dizerem no púlpito que, se Elias profetizou
segundo a sua própria palavra, e Deus cumpriu o que disse o profeta, ele também
tinha autoridade para determinar a bênção sobre o seu ouvinte, crente de que Deus
assinaria embaixo. Todavia, do que podemos aprender da Bíblia sagrada, nenhum
ministro tem autoridade para determinar o que quer que seja na vida de alguém
se não houver recebido determinação do próprio Deus. O caso de Elias não foge a
esta regra. Como informa o pastor José Gonçalves, nenhuma profecia que se
ajuste ao modelo bíblico tem seu ponto de partida no querer humano, mas na
vontade soberana de Deus (2 Pe 1.20,21).
No caso do profeta Eliseu, ao profetizar a vitória do rei Joás sobre os
sírios, ele apenas expressa a vontade do coração de Deus, não a sua própria
vontade. Isso está bem evidenciado na expressão “flecha do livramento do
Senhor” (2Rs 13.17). A expressão “Assim diz o Senhor”, amiúde usada pelos
profetas veterotestamentários, inclusive pelo profeta Eliseu (2Rs 2.21; 3.16),
reflete o desígnio divino na profecia e mostra que a origem da profecia está na
vontade soberana de Deus e não no homem.
2. A participação humana na profecia
(2Rs 13.17-19). Eliseu revelou o desígnio de Deus de que Joás venceria os sírios, mas a
profecia dependia da obediência de Joás em atender a ordem do profeta,
Primeiramente a ordem para atirar com sua flecha pela janela a esmo, sem ainda
mesmo saber do que se tratava. Segundo, a intensidade com que feriria seus inimigos
dependeria do número de vezes que o rei, atendendo uma segunda ordem de Eliseu,
feriria a terra com seu arco. Isso nos mostra que, a despeito de a
profecia ter sua origem na vontade soberana de Deus, a participação humana no
que diz respeito a obediência a Palavra de Deus, empenho e dedicação a causa de
Deus, discernimento e perseverança é de fundamental importância. O relato
bíblico mostra que Eliseu muito se indignou com Joás porque este feriu a terra
poucas vezes, demonstrando pouquíssimo discernimento, falta de fé e
perseverança. Mais uma vez recorremos ao comentário feliz do Pastor José
Gonçalves para dizer que uma fé tímida obtém uma vitória igualmente tímida,
verdade ressaltada por Jesus no Novo Testamento (Mt 9.9).
III. O ÚLTIMO MILAGRE DE ELISEU
1. A eternidade e a fidelidade de
Deus. Deus é soberano e eterno e faz coisas que a razão humana não consegue
atingir. No texto bíblico da lição de hoje temos o caso de um milagre realizado
postumamente por Eliseu. Depois de morto o homem de Deus, e já sepultado, um
defunto foi lançado na cova do profeta e, entrando em contato com seus ossos,
ressuscitou (2Rs 13.19,20).
É claro que Deus não faz nada sem um propósito firme relacionado às suas
criaturas. Deus não brinca de fazer milagres. Essa passagem revela dois
atributos de Deus e está relacionada à promessa feita a Joás antes de Eliseu
morrer (2 Rs 13.14-21). Contra o desespero do rei em razão da morte do profeta
(sempre fica uma sensação de desamparo quando morre alguém que servia de
suporte espiritual para nós), Deus mostra com este último milagre que o
encerramento da vida do profeta não põe fim às suas ações, pois o seu poder
subsiste a tudo e a todos (Hb 1.8).
“A incondicional prioridade de Deus em seu universo é uma verdade no
Antigo e no Novo Testamento. O profeta cantou essa verdade em linguagem de
êxtase: ‘Não és tu desde a eternidade, ó Senhor meu Deus, ó meu Santo?’ O
apóstolo João a expõe com cuidadosas palavras de denso significado: ‘No
princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele
estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele,
e sem ele nada do que foi feito se fez.’[...] Não podemos pensar certo sobre
Deus enquanto não começamos a pensar nele como estando sempre ali, e ali primeiro,
sempre existente antes de tudo mais. Josué teve que aprender isso. Ele fora
servo de Moisés, servo de Deus, e com tanta segurança recebera em sua boca a
Palavra de Deus, que Moisés e o Deus de Moisés se fundiram na mente dele, em
fusão tal que ele mal podia separar os dois pensamentos; por associação sempre
apareciam juntos em sua mente. Agora Moisés estava morto e, para que o jovem
Josué não seja abatido pelo desespero, Deus lhe fala para dar-lhe segurança:
‘Como fui com Moisés, assim serei contigo.’ Moisés estava morto, mas o Deus de
Moisés continuava vivo. Nada mudara e nada se perdera. De Deus nada morre
quando morre um homem de Deus.”
Em segundo lugar, este último milagre evidencia a fidelidade de Deus.
Ele não depende de circunstância, profeta A ou profeta B para cumprir seus
propósitos. É verdade que ele instrumentaliza pessoas, algumas de maneira
extraordinária, mas é Ele quem opera tudo em todos. Morrendo o profeta,
trocando-se o sacerdócio, mudando-se os tempos e os reinos, suas promessas continuam
de pé. Portanto, “ao permitir que o toque nos restos mortais de Eliseu
desse vida a um morto, Deus mostrava ao rei Joás que a morte de Eliseu não iria
impedir aquilo que há algum tempo ele havia prometido a ele” - palavras do
pastor José Gonçalves.
2. A honra de Eliseu. Há homens que deixam marcas
indeléveis na história e são honrados, lembrados e amados séculos depois de sua
morte. Em se tratando de grandes homens de Deus, como Eliseu, o próprio Deus dá
testemunho deles depois de finda a sua vida aqui. É assim que o eterno dá
testemunho de Noé, Moisés, Samuel, Daniel e Jó, séculos depois da morte destes:
“Ainda que Moisés e Samuel se pusessem diante de mim, não estaria a
minha alma com este povo” ( Jeremias 15:1)
“(...) ainda que estivessem no meio dela estes três homens, Noé, Daniel
e Jó, eles pela sua justiça, livrariam apenas a sua própria vida, diz o Senhor
Deu” (. Ezequiel 14:14).
No caso do milagre póstumo realizado por Eliseu, além do objetivo de
mostrar sua fidelidade e eternidade, Deus objetivava honrar a memória de seu
servo, honrando-o mesmo depois de morto. Séculos depois de sua morte, o nome de
Eliseu continuaria sendo lembrado como um homem de Deus. Existem sempre algumas
peculiaridades envolvendo a vida e a morte de grandes homens de Deus. Como
destacado pelo pastor José Gonçalves, Elias subiu ao céu vivo, Eliseu
deu vida mesmo estando morto. Os intérpretes destacam que esse milagre de
Eliseu mostra que o Senhor possui planos diferenciados para cada um de seus
filhos e que, portanto, não devemos fazer comparações nem questionar os atos
divinos (Jo 21.19-23). A Bíblia fala de homens cujas ações continuam falando
mesmo depois de suas mortes (Hb 11.4).
IV. O LEGADO DE ELISEU
1. Legado sociocultural. O legado sociocultural de
Eliseu está bem apresentado nas palavras do pastor José Gonçalves. Já
estudamos que Eliseu supervisionava a escola de profetas (2 Rs 6.1). Esse sem
dúvida foi um dos seus grandes legados. Todavia Eliseu fez muito mais. Ele teve
uma participação ativa na vida social da nação. Enquanto Elias era um profeta
do deserto, Eliseu teve uma atuação mais urbana. Eliseu tinha acesso aos reis e
comandantes militares e possuía influência suficiente para deles pedir algum
favor (2 Rs 4.13). Como povo de Deus não podemos viver isolados da vida social
da nação, mas aproveitar as oportunidades para abençoar os menos favorecidos.
2. Legado espiritual. As façanhas realizadas por
Eliseu em nome do Deus de Israel seriam contadas e recontadas no decorrer da
história, para fortalecer e enlevar a fé dos crentes. Tais façanhas
enunciam o legado espiritual de um homem que viveu para fazer a vontades de
Deus. Ouvi de certo pregador a seguinte afirmativa: “O mundo precisa ver o que
Deus pode fazer com um homem totalmente entregue em suas mãos”. Os
contemporâneos de Eliseu viram Abertura do Jordão (2 Rs 2.13,14); a purificação
da nascente de água (2 Rs 2.19-22); a multiplicação do azeite da viúva (2 Rs
4.1-7); a ressurreição do filho da sunamita (2 Rs 4.8-37); a cura da panela
envenenada (2 Rs 4.38-41); A multiplicação dos pães e das sementes (2 Rs
4.42-44); a cura de Naamã (2 Rs 5); o machado que flutuou (2 RS 6.1-7); o caso
de Dotã (2 Rs 6.11-23); escassez e festa em Samaria (2 Rs 6.24—7.20); revelação
a Hazael (2 Rs 8.7-15); profecia ao rei Jeoás (2 Rs 13.14-19) e a ressurreição
de um homem (2 Rs 13.21). É, de fato, um grande legado espiritual.
CONCLUSÃO
Ouvi de certo pregador a seguinte afirmativa: “O mundo precisa ver o que
Deus pode fazer com um homem totalmente entregue em suas mãos”. Os contemporâneos
de Eliseu viram de perto. Nós vemos através do relato bíblico...
Bispo. Capelão/Juiz. Mestre e Doutor em Ciência da Religião Dr. Edson
Cavalcante.
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