SERMÃO SOBRE AITOFEL...
(II Sm
15:31-34).
Ficar no prejuízo nunca
foi uma atitude muito aceitável, pois ninguém gosta de saber que o seu direito
não é respeitado. A princípio quando somos injustiçados somos levados a um
comportamento que nos faz reagir exteriorizando a revolta ou interiorizando uma
falsa conformação em virtude da impotência diante do fato.
A perda provoca dor e
muitas vezes não podemos chorar ou mostrar a revolta, pois podemos ficar em
situação comprometedora diante dos algozes, ou por não admitirmos que não somos
tão preparados como pensamos. Admitir que fossem atingidos é problemático, pois
alguns aprenderam a conviver ou maquiar perfeitamente o sentimento traumático.
Precisamos perceber com clareza a instalação da revolta, pois este sentimento
torna-se aprisionador, onde viveremos enclausurados dentro de nós,
estabelecendo um comportamento que expressará uma vida hipócrita, pois
aparentaremos colaborarmos com o bem, enquanto não depararmos com a realidade
que nos aviltou, pois daí em diante é melhor sair da nossa frente!
Antes de falarmos da
vingança, deveremos avaliar a condição de justiça, pois apenas os injustiçados
precisam de justiça e se esta tardar, apelarão para as suas próprias mãos.
Quando esperamos pela justiça entendemos que existe a lei e os legisladores,
portando um tribunal que avaliará as causas para estabelecer um veredicto, onde
o seu parecer estipulará uma sentença.
Esperar os
acontecimentos decorrentes do processo, nos leva a uma exposição diante dos
homens e para aqueles que possuem a fé, o veredicto sempre será a vontade
estabelecida por Deus. Isto pode ser complicado, pois se Deus quiser fazer
justiça para o opositor, podemos cair em um processo de rebelião, pois aprendemos
que quando somos de Deus ele sempre nos dará vitória.
Acredito que a derrota
pode ser uma grande vitória, pois nem sempre estamos no centro da vontade de
Deus, aliás, quase sempre, pois duvidoso e enganoso é o coração e na
normalidade da vida, ouvir a voz de Deus não é tão fácil, quando a voz dos
nossos interesses nos deixa surdos à palavra de Deus.
Esperar a justiça nos
leva a questionamentos legais referentes aos legisladores. Vivemos em uma época
onde a corrupção nos impulsiona a evitar os tribunais, pois a lei, mesmo quando
exercida corretamente, encontra uma impunidade que transcende a sua aplicação,
pois aqueles que deveriam estar encarcerados, estão nos cárceres controlando
aqueles que legislam. Esperar pela lei ou pela justiça dos homens pode não ser
a melhor opção quando interesses políticos estão sendo colocados em questão,
enfim, quando estamos nos tribunais vale mais aquilo que será interpretado
segundo a retórica
daqueles que labutam no universo legal, do que propriamente, o interesse
daqueles que são beneficiados pela aplicação legal.
As demandas sociais são
intensas e a morosidade, aliada a impunidade, em conseqüência da falta de
julgamento dos transgressores, está permitindo o nascimento de uma milícia que
faz justiça com as próprias mãos, pois desistiram de se esconder atrás do medo,
pois aprenderam que a única justiça que se pode acreditar é aquela estabelecida
pelo poder do dinheiro ou das armas de fogo.
Gostaria de meditar na
vingança, pois ela tem como objetivo a destruição do outro e isto é
problemático, pois podemos matar pessoas de algumas maneiras. A primeira é a
mais comum, que é tirar a vida de maneira sanguinolenta, eliminando o fôlego de
vida. A outra é quando tiramos a vida existencial do outro, não é derramado nem
uma gota de sangue, mas aniquilada a identidade do outro, onde tudo aquilo que
era referencial de valores de auto-afirmação não lhe é permitido. Este fato é
notório quando eliminamos do outro a possibilidade de ter ou de realizar os
seus sonhos, ou quando não permitimos ao outro o desenvolver do seu potencial.
A vingança é um
sentimento que encontra a sua materialização na destruição do outro. O seu
início se dá quando não conseguimos superar a perda daquilo que nos foi tirado,
não importa se tínhamos o direito de posse ou não, se é material ou
sentimental, apenas uma realidade do ser que é mais forte do que a
possibilidade do prejuízo encontrado no estilo de vida daqueles que optaram
pelo perdão.
A vingança de Aitofel é
um exemplo notório de causas e efeitos desta escolha pessoal. Podemos esperar
na justiça dos homens e na justiça de Deus, mas o caminho mais excelente ainda
é o do perdão, pois independente dos efeitos e causas, a cura interior do
injustiçado, não está no aniquilamento do injusto, mas sim na maturidade de não
ser atingido em sua psique pelas conseqüências decorrentes das perdas que lhe
foram impostas pela vida. Enfim os verdadeiros vencedores são aqueles que não
se abatem com as derrotas.
Aitofel era um homem de
Deus, um conselheiro do rei Davi, portanto um homem sábio com maturidade para
resolver problemas nacionais, auxiliando com sua sabedoria, em decisões que
mudaria a história de muitos. Verificamos que independente de idade e
maturidade seremos tentados a agir loucamente quando somos dominados pela vingança.
Somos impulsionados a esquecer todos os valores éticos e morais quando optamos
por caminhar segundo a motivação vingativa.
Aitofel era pai de
Eliã, que era pai de Bate Seba, esposa de Urias, o qual Davi mandou para frente
de batalha para morrer, pois queria encobrir o pecado da gravidez indesejada.
Davi coabita com a mulher de Urias e encontra-se agora em uma situação
complicada diante da lei, pois os adúlteros deveriam ser mortos apedrejados,
haja vista que Urias estava na batalha e não tinha contato sexual com Bate Seba
para engravidá-la.
Aitofel presencia a sua
neta ser possuída pelo rei e precisa ficar em silêncio diante da morte do
valente Urias. A injustiça assolou a casa de aitofel e ele nada pode fazer,
pois o único que poderia defendê-lo é na realidade o mentor da sua desgraça
familiar. Acredito que houve uma reunião de família onde Eliã e Aitofel
confabularam a respeito do assunto, mas a autoridade de Davi estava acima dos
conflitos familiares, pois aquele que teriam de julgar a princípio era o homem
que trazia honras para a casa de aitofel, pois tudo aquilo que sua família era,
acontecia decorrente da influência obtida através de Davi.
Perdoar Davi a
princípio era a atitude mais sábia, pois quem poderia confrontar o rei? Quem
poderia ir contra aquele que era aclamado pelo povo e estabelecido por Deus
para reinar? Acredito que o silêncio nem sempre é demonstração de conformidade,
as vezes é conseqüência da intimidação, onde a submissão a autoridade não é
reflexo de submissão a ela, mas sim ao efeito da não obediência. Davi era rei e
estava recebendo conselhos de alguém que tinha uma causa pendente com ele, e
isto a princípio acontecia pelo temor de Aitofel em atacar Davi frontalmente.
Verificamos que Aitofel não reage e permanece na sua posição, entendendo que
Davi passaria, encontrando em certo tempo o momento exato para a sua queda,
pois se Deus exaltou a Davi ele mesmo o humilharia.
A problemática de
Aitofel é que ao mesmo tempo ele não queria ver a queda do rei, pois era fiel
ao seu ministério, mas o sangue de Urias e a vergonha de sua neta, clamavam
mais fortes em sua mente. Aitofel já não poderia aconselhar corretamente a
Davi, mas fazer o que? O conflito entre fazer a vontade de Deus e a vontade dos
homens é complicado, quando a vontade de Deus diz para se subordinar a Davi,
mas a vontade dos homens diz que Davi precisa ser julgado. Verificamos
posteriormente que Deus julgou Davi, usando o profeta Natã e deixa escrito na
sua palavra que Davi foi homem justo diante dele, exceto no caso de Urias. A
história de Davi foi manchada, Deus não deixou a criança crescer, levando-a
após o nascimento para junto dele. Deus foi fiel a Urias, pois apesar da sua
morte, foi de Bate Seba que nasceu o rei Salomão. Apesar da sua vergonha,
aprouve a ela a honra de ser mãe do sucessor de Davi.
Aitofel esperou o
momento certo para estabelecer a sua vingança, pois esperava a queda de Davi,
ao invés do seu reconhecimento de erro, pois já não percebia o sentido da sua
função como conselheiro, pois agora ao estabelecer a sua própria justiça,
esquecia da justiça de toda uma nação, ameaçada pelo conflito em estabelecer o
seu direito familiar.
Davi provou da ira de
Absalão, filho rebelde que provou o silêncio do pai, pois ao matar seu irmão
Amnon, que deflora a meia irmã, Tamar, não foi em momento algum
censurado por seu pai,
que da mesma forma fingiu não saber do incesto do irmão assassinado. Uma
família que tinha um filho assassino e outro assassinado, uma filha violentada
e um pai ausente.
Absalão toma o reino de
Davi e recebe de aitofel um conselho que envergonharia Davi publicamente. Ao
sair, Davi deixa algumas concubinas que são usadas por absalão publicamente.
Aitofel foi o mentor deste conselho e tentou assim atingir a imagem de Davi.
Aprendemos com isto que o sentido inicial daquele que é movido pela vingança é
atingir a identidade do outro, pois de uma maneira difamatória, tentará atingir
aquilo que o outro pensava ser, destruindo assim o seu sentido existencial, que
agora terá de alcançar uma nova percepção da realidade, ou negar a difamação
proposta, com um comportamento que não condiga com o exposto. O problema é que
em alguns casos não poderemos mudar a situação, como foi o caso de Davi, sexo
consumado é sexo consumado, com prazer ou sem prazer...
O primeiro passo a ser
superado é manter a auto-imagem, pois se esta for atingida, aquele que se vinga
consegue atingir a primeira meta do seu objetivo, pois esta pessoa encontrará
agora na situação que o ofensor se encontra, que é sofrendo por uma injustiça
cometida. Normalmente o alvo inicial é aquele que segundo a ótica vingativa
estabelece a sua dor. Aitofel sofria pelo descrédito de sua neta e agora espera
que Davi sofra ao encontrar o seu leito maculado, como foi o de Urias.
Algo que deveria trazer
nojo para aitofel traz agora prazer, pois ao ver a vergonha de Davi, estava
presenciando a vergonha de Israel e da mesma forma da sua própria casa que fora
atingida. Aitofel tem prazer com a vergonha de Davi, porém é temporária a sua
satisfação, pois em seguida descobre que a sua verdadeira intenção não é apenas
ferir a Davi emocionalmente, mas é matar Davi fisicamente, e solicita a Absalão
um exército para buscar Davi e matá-lo. Absalão apesar de odioso, recebe agora
outro conselho dado por Husai, onde Aitofel fica sem cumprir o seu desejo
final.
Aprendemos com a
estória de Aitofel, que o final da vingança é sempre a morte física e não
apenas existencial do outro, e se isto não acontecer, provaremos do suicídio,
por não suportarmos a nossa própria existência.
Quando não se consegue
atingir o objetivo final, arruma-se a casa, da maneira mais organizada
possível, mas provando da desorganização causada pelo ódio e da vingança, que
não permitem viver a nossa realidade diante da vida do outro, que por um motivo
que não aprovamos, foi inocentado pela vida, pelo tribunal humano, pela
história e por Deus. A vingança de aitofel foi a sua desgraça, pois foi o
motivo do seu suicídio, nos ensina que um coração inclinado a este sentimento
provará certamente o próprio extermínio, pois independe de uma história dita
como sendo de um homem de Deus, mas sim de um homem dominado pelo ódio que não
provém de Deus...
BISPO/JUIZ. MESTRE E
DOUTOR EM ÊNFASE E DIVINDADES DR.EDSON CAVALCANTE
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